O Inverso em
desencanto
Um partido político, dito de esquerda, conseguiu
em 13 anos o que a ditadura de Getúlio jamais sonhou nem tampouco os militares
na época dos anos de chumbo, além disso conseguiu superar as expectativas dos
magnatas banqueiros e das grandes construtoras com seus oligopólios.
Retraiu a Reforma Agrária e deixa um saldo de mais
de 11 milhões de desempregados, uma inflação descontrolada e um déficit interno
impagável. Consumiu empresas simbólicas da soberania nacional como a Petrobrás,
Caixa Econômica, Correios, BNDES.
Corroeu a confiança de nações estrangeiras em
nosso país. Um PIB negativo, uma saúde pública em estado de miséria. Os pobres
que respiraram por alguns anos aliviados agora pagam o preço da corrução
galopante e enraizada, enquanto os ricos estão mais ricos.
O que ele conseguiu e que nenhuma ditadura
conseguiu até então, foi matar o ‘espírito’ da esquerda.
Seus líderes foram tragados pela volúpia do poder
aparente que o dinheiro proporciona e a falsa impressão do absoluto, como um
Luís XIV tupiniquim. O sistema corrompeu esses líderes e eles se deixaram
corromper numa orgia perversa.
Muitos artistas, intelectuais, pobres, negros,
índios, mestiços, minorias de gênero, teólogos, foram cooptados e se viram num
alçapão que ao menor movimento de libertação sentem o peso do que é discordar
do sistema que serve ao sistema maior.
Hoje militantes pagos passam em procissão como
ovelhas à tosquia, com seus balidos sem eco.
Afogado na sua própria história não sabe o legado
que deixará para a memória de um país em desencanto. Afogado, levou consigo
outros partidos, abraçados nesse festim que eu chamo de a Festa de Pandora que
atingiu seu auge em finais de 2014, para o fundo de uma piscina cheia de ratos,
como diria o poeta.
A única vantagem, se é que há alguma, de se chegar
a tal estado (ou seria Estado?), é saber que a libertação está próxima. O
Brasil é muito grande e mal tratado, porém é imprescindível para um equilíbrio
mundial. Abaixo do fundo dessa piscina, se não houver um sorvedouro maior e
mais escondido, não há mais para onde descer.
Um mínimo de credibilidade e razoabilidade para se
organizar o país em nível macro enquanto no dia a dia que as pessoas se
organizassem em sistemas cooperativistas que respeitam as liberdades individuais
e proporcionam ganhos justos a cada um conforme seu trabalho.
Pandora ao abrir sua caixa distribui benesses,
bônus, carnavais, fogos de artifício, mas depois vai cobrar bem caro o valor
dessa falsa festa.
O partido distanciou-se das bases seduzido pelo
brilho do ouro, confiou naqueles que dizia repudiar, banqueteou-se com a comida
envenenada da cobiça e bebeu do cálice da luxúria. Aliou-se com quem não podia
e cego pelo brilho da opulência não viu sua ruína próxima. Levou consigo a
utopia de milhões de pessoas trabalhadoras e hoje morre tristemente nesse maio,
‘sem retrato e sem bilhete, sem luar’ nem canção. Triste caricatura de quem foi
um dia a personificação da esperança de um povo, de uma nação, como um último
desejo.
Assuero Gomes
Médico e escritor