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quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Helder e a folia de Deus











Helder e a folia de Deus

Profetas são sisudos, são sérios, são graves. Profetas choram, clamam, anunciam, denunciam. Profetas enxergam onde ninguém vê, pois têm com eles o olho de Deus.
Os profetas escutam o clamor do povo oprimido, os profetas escutam a resposta de Deus, os profetas falam. Mas os profetas não precisam ser todos Jeremias, nem Amós, nem Elias. Não precisam ser casados como Oséias. Podem ser Francisco, podem falar com peixes e pássaros, podem ficar loucos de amor e sair dançando e cantando enquanto falam da misericórdia de Deus para com suas criaturas e especialmente pelos pobres. Os profetas podem até ser poetas, ou dançarinos. Loucos, podem enxergar música e ouvir dança onde há números e números e estatísticas e movimento de coordenadas e abscissas.
Profetas podem perceber a dança dos astros como um carrossel mágico de uma festa de interior, podem vê-la com os olhos da criança simples da roça que se encanta com o movimento dos cavalinhos azuis de todas as cores, rodopiando na música mágica do carrossel, nas cores mágicas do carrossel.
Os profetas podem admirar a Criação como se admira um sábado de carnaval dos tempos idos e dos tempos do coração, em blocos harmoniosos, familiares, com seus cortejos onde todos são iguais em dignidade e graça.
Os profetas sabem que reis e rainhas são verdadeiros, apesar das fantasias, quando servem na alegria os irmãos e irmãs e se encantam também com as cores do caboclo guerreiro de lança rural, que sabe extrair alegria e cor de uma vida sofrida e dos Papangus que, sem cerimônia, invadem a casa do próximo com sua alegria e partilham a refeição. È a fita colorida, é o sorriso, é a sensação de pertença a um povo, a uma comunidade. Uma imensa alegria que só os filhos e as filhas de Deus podem experimentar, sem remorso, sem culpa, sem ter que pedir perdão.
A laursa organiza os pobres, ensina-os a repartir o apurado, ensina-os a caminhar na pobreza e na música como os loucos nas ruelas da medieval Assis e ainda denuncia que o avarento não pertence à festa.
Os blocos podem adentrar nos mosteiros e receber a bênção, porque nosso Deus é um deus de fartura e de ternura que se enternece com a poesia que brota das melodias das manhãs de sol de Olinda e Recife, dos coqueirais, do mar, dos canaviais, dos sertões. Tudo é poesia, tudo é melodia, pelo menos neste tempo propício.
Os profetas podem perceber a folia de Deus, que embriagado de amor, criou o universo em movimento, como uma evolução rítmica de um bloco de caboclinhos ou o ribombar dos tambores do maracatu, ou ainda como um desfile de uma escola que organiza o caos da multidão em instantes de frevo. Os profetas percebem que Deus abençoa os que brincam, os que amam, os que tornam a vida mais bela, os que aliviam o fardo do outro, mesmo por alguns dias apenas.
Há profetas que nascem em tempo de carnaval, esses são mais lúdicos, mais humanos. Esses percorrem as ladeiras da vida, junto ao povo, distribuindo doces em forma de palavras e de carinho, aspergindo água de cheiro,confetes e serpentinas multicores, abençoando, bendizendo, cuidando.
Há profetas que nascem em fevereiro.


Assuero Gomes

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