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quarta-feira, 11 de abril de 2012

Anencéfalos num país acéfalo








Anencéfalos num país acéfalo



Bucéfalo era o cavalo de Alexandre o Grande, o maior general que se tem registro na história da humanidade. Era um cavalo inteligente e aprendeu a conviver com seus limites ao encarar o sol. Muito inteligente este cavalo.

Há países acéfalos. Ou seriam países governados por anencéfalos? Ou ainda, anencéfalos governados por microcéfalos?

Pobres anencéfalos biológicos, humanas crianças que ao nascerem trazem pequenos momentos de amorização filial, pequenas fímbrias afetivas, instantes de vida que, efêmeros como a flor da noite, voltarão ao Criador intocados pelo pecado, imaculados. 

Microcéfalos adultos duvidam que haja pessoa humana nos pequenos entes que por algum motivo não desenvolveram a totalidade dos órgãos de uma criança completa. Dir-se-á a princípio que por ser inviável a vida biológica por muito tempo, haverá de se interromper a gestação, e assim, neste princípio, os microcéfalos passarão a ter direito de interromper os cardiopatas graves cuja gravidade cardíaca os impedirá de viver mais que um dia fora da primeira casa, o útero materno, e assim de desprincípio em desprincípio haverá de só nascerem os viáveis, os sadios e mais tarde apenas os sadios mais bonitos e os que serão mais inteligentes, mais fortes, mais competitivos...

Ah, já ouvimos esta fúnebre melodia germânica na década de trinta.

Mães, se assim podem ser chamadas, pensando que têm um corpo, esquecem que na verdade são um corpo. Seus fetos não têm um corpo, eles são um corpo também. São outros. Não são apêndices da mãe. São o Outro. Carregam em si mesmos toda a carga ancestral de bilhões e bilhões de anos do universo, de lutas, de travessias, de virtudes e defeitos, enfim, de humanidade. São únicos e sua individualidade é um desafio e um consolo, são a prova que a diversidade e a pluralidade são intrínsecas dos humanos. São de sua natureza.

Quando Deus quis deixar sua Palavra para os homens e as mulheres, muito antes de transmiti-la através das escrituras e da boca dos profetas, Ele a inseriu no íntimo do íntimo de cada ser vivo, na centopéia e no rinoceronte, na borboleta como no flamingo, tanto na grama como no casal de namorados sobre ela, e em cada embrião humano. Deus escreveu a palavra da vida através de quatro letras apenas, a saber T (timina), A (adenina), C (citosina) e G (guanina), que constroem o genoma.

Os recém-nascidos que por um motivo ou por outro trazem algum defeito na expressão corporal desta linguagem divina, são seres vivos, filhos do Homem, filhos de Deus.

Anencéfalos na verdade são aqueles que, olhando para a luminosidade infinita que emana da fonte primeira de toda criação, de onde brota toda a vida, não se sentem ofuscados. Talvez estejam cegos de presunção e a luz já não incomode, talvez estejam cegos de ignorância e achando que enxergam se ceguem cada vez mais.

Microcéfalos criaram uma sociedade abortiva, que mata de fome suas crianças jogando-as na periferia da vida, sem chance, sem esperança. Contraditória sociedade que discute o aborto e semeia embriões ao léu, e semeia caixões de anjos nus.

Bucéfalo, o cavalo de Alexandre, era um cavalo inteligente...



Assuero Gomes

Médico e escritor

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