A Vida além da Morte (II)
Conforme reflexão anterior, vimos que nossa unidade pessoal (o eu) se mantém através do tempo, mesmo com a mudança, por renovação das células, do nosso corpo e se mantém além do tempo, pois a Vida não depende do corpo e sim o corpo é que depende da Vida. A Vida é eterna, porém necessita se exprimir através de um corpo, pois existimos na medida em que somos percebidos pelos outros.
Entra agora nesta nova reflexão a questão do tempo, que é um pouco mais complicada.
Vimos que atravessamos o tempo, com um corpo sempre em contínua mudança, mas que de uma maneira misteriosa preserva a nossa unidade. Como a vida é eterna e nossa unidade é eterna, precisamos mergulhar no mistério da eternidade.
No nosso conceito clássico de tempo, o imaginamos como algo contínuo, passível de aferição, perpétuo, ora percebido de maneira mais rápida ora mais lenta, inexorável, profundo e enigmático. As crianças têm a velocidade do tempo como mais lenta, pois sua referência é o seu ainda curto espaço de vida aqui na Terra. Uma criança de cinco anos sente o período de um ano, como algo que é 1/5 de toda uma vida, no entanto um idoso de 90 anos vai perceber o mesmo período, como uma ínfima e rápida fração de sua vida.
A eternidade nos é percebida como um tempo que não se acaba, extremamente longo, que não se pode medir por ser infinito, um tempo infinito; porém este conceito está equivocado. Na realidade a eternidade não tem tempo. O tempo não pertence à sua dimensão. Temos que apreender e introjetar bem este conceito, para podermos seguir na reflexão.
Na eternidade não há nem ontem, nem hoje, nem amanhã, nem séculos, nem passado, nem presente, nem futuro. Nem já, nem ainda, nem antes, nem depois. Na eternidade não há tempo! É lá onde vive Deus.
Durante muitos séculos a proposição da vida após a morte foi um grande dilema para os teólogos e religiosos em geral, e ainda o é. No princípio a questão era o seguinte: quando um justo morre ele fica esperando a segunda vinda de Cristo (Juízo Final) para que este o despertasse (ressurreição) dos mortos e o colocasse definitivamente no paraíso. Sendo a alma eterna, então onde, como e quando esta ficaria? Além disso, os que morriam em estado de santidade teriam de esperar esta segunda vinda de Cristo (parusia) e seus corpos conheceriam a corrupção da carne (putrefação cadavérica)? Daí o costume antigo de enterramos nossos mortos nas igrejas, para que quando Cristo voltasse os ressuscitasse logo, e daí também a questão de não se aceitar muito bem a cremação.
Voltemos à questão da Vida, da eternidade e da nossa unidade.
Ora, se a Vida é eterna, se na eternidade não há tempo e se nossa unidade (eu) se perpetua na eternidade, é de se supor que quando morremos entramos na dimensão do eterno, com um novo corpo, eterno, imutável, incorruptível, portanto, que comunica definitivamente e plenamente nossa unidade pessoal. Participamos então do convívio imediato e pleno de todos os entes queridos (pudéssemos aplicar o conceito de tempo na eternidade diria aqui, que todos os entes queridos ancestrais, os atuais e os futuros que não tivemos condições de conhecer ainda na Terra).
Creio firmemente que ao partirmos desta dimensão temporal, encontrar-nos-emos com o Cristo num grande e universal abraço fraterno, e estaremos todos juntos, pois só há felicidade plena onde todos os que amamos estiverem felizes conosco.
Assuero Gomes
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