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terça-feira, 11 de outubro de 2011

A Palavra

                                                                Paisagem de Natal





A Palavra

A palavra pesa. Por mais leve que seja, ela pesa e pesa muito. Muitas vezes ela corta e esgana, noutras acaricia; às vezes tenta alçar vôo, como nos versos apaixonados onde quase alcança a lua ou no ardor se derrete ao sol, mas sempre volta a quem as pronuncia.
As palavras, que de letras são construídas, muitas vezes são arqueológicas. Vêm das profundezas de civilizações ancestrais, em formas de hieróglifos, marcadas que foram em tabuinhas de argilas babilônicas, ou viajantes em navios fenícios. Atravessam oceanos em livros, papiros ou mentes aventureiras. Como mulheres podem ser sutis e serenas e manterem-se pudicas em quaisquer travessias, ou podem resvalar na vulgaridade efêmera de amores fáceis e se deixarem possuir, voluptuosas.
Palavras chegam a Deus pelo coração das crianças órfãs e pelas súplicas de justiça das viúvas, são sagradas; ou melífluas quando penetram o caos e alcançam o maligno, no engodo, na luxúria e devassidão, no suborno e na maledicência. Palavras cortam e esfoliam, mas também reconstroem e restauram. São lâminas de adagas e punhais, são bisturis, precisos bisturis. Pérolas que não devem ser atiradas aos porcos, espadas que devem ser desembainhadas contra a injustiça e a opressão.
Completas, finitas, esgarçadas, soltas ao vento, mas perigosas, tremendamente perigosas e temidas. Nelas reside toda forma de poder. Mortífera e vivificante. Veneno e remédio. Consolo e aflição.
Há palavras eruditas, finas, sofisticadas. Há palavras maltrapilhas. Palavras mortas e esquecidas nalgum canto de um glossário inacabado. Palavras que ainda irão nascer, outras caquéticas de tanto andar sem destino e sem guarida. Palavras bêbadas de rua, palavras ermas e solitárias. Palavras abortadas antes da pronuncia e que ficarão enterradas para sempre. Palavras cegas de versos mancos. Palavras sofridas, afogadas em lágrimas de pêsames. Gritos de exclamação, sussurros de amantes, queixas não ditas, palavras arrependidas de amores infantis não verbalizados.
Palavras há de todos os tipos, de todas as castas, de todas as classes. Palavras que elegem poderosos e que derrubam poderosos. Palavras que salvam, que embrutecem, que enternecem.
Resíduos de palavras amarrotadas jogadas ao lixo, cinzas de palavras consumidas pelo fogo do desvario, do sofrimento e da solidão. Carvão e cinza que retornam em outras palavras. Palavras de nascer e de morrer. De se dar em casamento, de se comemorar. Palavras bordadas em mantos e túnicas, em féretros ou berços. Palavras bem-vindas, outras jamais queridas.
Nada no mundo é tão poderoso quanto a palavra, pois no início era a palavra, e tudo foi criado através dela, e nada do que foi criado foi criado sem ela, e ela armou sua tenda e habitou entre nós.
Uma só palavra, no entanto, nos basta, a única Palavra.
A Palavra é a luz da humanidade, e ela veio para iluminar o dia, para que os que andam na luz não tropecem e possam fazer as obras daquele que a enviou. A todos os que reconhecem e ouvem a palavra e a põe em prática, a estes, foi dado o direito de serem reconhecidos e chamados de Filhos da luz.
Bom dia!

Assuero Gomes

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