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quarta-feira, 30 de agosto de 2017

54 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 54



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54 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 54



Finalmente pudemos inaugurar o nosso restaurante para os pobres, chamado de O Dom da Partilha, em homenagem a D. Helder e como resposta aos pobres que ficaram esperando a refeição depois da missa das Fronteiras.
No sábado anterior houve uma pungente celebração na capela do seminário dos salesianos, lá mesmo onde ficava instalado o restaurante.
Frei Aluizio preparou com sua turma uma encenação do encontro de Francisco com o Pobre. Belíssimo momento. Podíamos sentir a presença do próprio Cristo naquele momento.
Na segunda-feira iniciamos, com um movimento sempre crescente a cada dia. Nossos temores de que os pobres iriam fazer confusão, sujar a rua, brigas, nada disso aconteceu. Vinham tranquilos, pegavam a sua quentinha, podiam escolher dois tipos de comida, geralmente carne de boi ou frango, sempre acompanhada de feijão, farinha, arroz ou macarrão e algum tipo de verduras. Pesava sempre 400g ou mais. Ninguém estragou nada.
Havia um casal de velhinhos que dividiam uma refeição para os dois, outros passaram a comprar remédio com o dinheiro economizado da comida, outros vinham de longe comer ali e uma vez questionados disseram que como não pagavam ônibus pela idade vinham fazer a refeição e que geralmente era a única do dia.
Certa vez apareceu um rapaz relativamente jovem, sem camisa, o rosto um pouco sujo, entrou na fila como todos os outros e pediu para comer de graça. Foi explicado que não podia ele então pegou uma moeda de 50 centavos e continuou pedindo até que se cedeu dizendo que era a única vez. Pois bem, alguns dias depois chega um rapaz, bem vestido, e diz que veio fazer uma doação, pois viu que o projeto era sério, ele tinha se passado por pobre e pediu para comer com desconto, a comida era boa e digna, viu que tudo estava correto. Ele fez uma boa doação em dinheiro que deu para servirmos todos quase um mês sem maiores problemas. Soube depois que era dono de uma cadeia de lojas de roupas nos shoppings.
Havia um velhinho que vinha todo dia comer que era  igualzinho a S. Vicente (como nós o conhecemos através da pintura), impressionante.
O mais impressionante porém aconteceu e não sei explicar: certa vez eu rezando pedi a Jesus que me mostrasse se estava satisfeito com o trabalho de todos no Dom da Partilha, e nos abençoasse.
A uma certa hora senti como se dissesse 'vou fazer uma refeição com vocês'. Não ouvi, apenas senti e pensei ser apenas um desejo meu, uma impressão de fé, algo emocional ou psicológico, com grande força de consolo.
Dois ou três dias depois, a funcionária que despachava as quentinhas me contou (sem eu nada dizer) que apareceu um homem estranho, um mendigo enrolado num pano grosso como um cobertor, algumas feridas no corpo e com mau cheiro, que inclusive afastou um pouco os outros que estavam na fila. Pediu uma refeição (-'Vim comer'), agradeceu e partiu sem ser nunca mais ser visto. 






terça-feira, 29 de agosto de 2017

53 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 53


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53 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 53


A prática das virtudes vicentinas é muito difícil. 'Logo vi que a caridade pesa muito mais que o caldeirão de sopa que preparamos para os pobres' e 'somente por muito amor os pobres me perdoarão pela comida que lhes demos'. Quase impossível para o cristão comum.

Depois que saí da derradeira reunião do Igreja Nova, procurei me acalmar e por as ideias no lugar.
Nos próximos dias passei a me reunir com as pessoas que me deram apoio. Fernandinho, lá do Grupo Jovem, Pe. João Pubben, Fernando Lindoso e Carminha, Irmã Vanda, Jovem e Goretti que nos doaram as panelas, Pe. Arnaldo Cabral, Frei Aluizio, Aderson, Concita e Tereza Luna que deram uma estrutura jurídica ao nosso estatuto, do qual Pe. Arnaldo disse: 'isso é uma regra para qualquer ordem ou congregação religiosa'. O nome escolhido foi "O Dom da Partilha" e sua formatação era de uma Sociedade Civil sem fins lucrativos.

Corri contra o tempo e as dificuldades.

Transcrevo a seguir alguns trechos do estatuto:

Art. 3     -       Tem por finalidade o serviço aos pobres, especialmente fornecendo refeição e outros serviços essenciais de atendimento aos mais necessitados.
 Art. 4      -      São associados de O Dom da Partilha os que assinaram a ata de fundação, e todos aqueles que quiserem de livre e espontânea vontade servir aos pobres com gestos concretos de serviço e doação e que manifestarem o interesse em participar deste grupo.
Art. 5       -     São direitos e deveres dos associados participar dos trabalhos do grupo. Votar e ser votado para qualquer cargo. Trabalhar para que a finalidade do grupo seja mantida. Respeitar e preservar os ideais do grupo contidos na ata de fundação e neste estatuto. Contribuir, angariar, procurar recursos materiais para que o serviço aos pobres seja cada vez mais ampliado. Divulgar o trabalho do grupo em todos os lugares e meios disponíveis.
Art. 6      -   O associado deve participar das assembléias ordinárias e extraordinárias. Deverá exercer com alegria e fidelidade os trabalhos, as funções e os cargos a que for solicitado em votação.

Art. 13     - Os membros do conselho servidor, responsáveis  diretos pela administração do grupo, estarão lotados nos seguintes cargos: Servidor Administrador, Servidor Tesoureiro e Servidor Secretário.
Parágrafo 1  - O presidente vitalício na dimensão plena é D. Helder Camara e o presidente de honra é o padre João Pubben.
 Art.  21      -   O grupo  O Dom da Partilha não distribui dividendos nem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a título de lucro ou participação no resultado; aplica integralmente no país os seus recursos na obtenção dos objetivos institucionais a que propõe, e emprega o “superavit” eventualmente verificado em seus exercícios financeiros,no desenvolvimento de sua finalidade cristã; mantém escrituração de suas Receitas e Despesas em livros revestidos de formalidades, capazes de assegurar sua exatidão.
Parágrafo único:  É vedada a remuneração dos cargos do Conselho de Servidores e do Conselho Fiscal, bem como a distribuição de bonificações, pró-labores, vantagens, a dirigentes, mantenedores e associados, sob nenhuma forma ou pretexto.

O presente estatuto foi aprovado em Assembléia Geral no dia 12 de abril de dois mil e três, na sua sede provisória.

Mírcia Rúbia Sôlha Gomes, secretária desta assembléia.

 Assuero Gomes da Silva Filho,

Fernando Nabor Lindoso,

Fernando Antonio de Queiroz Brito

Maria do Carmo Menezes Bezerra Duarte

Edelomar Santiago Barbosa













segunda-feira, 28 de agosto de 2017

D. José Maria Pires


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D. José Maria Pires



Faleceu o nosso bom arcebispo da Paraíba. O homem que recebeu de braços abertos os sacerdotes e religiosos da diáspora de Olinda e Recife. O homem que se intitulou D. Pelé e depois revendo sua opção de vida, D. Zumbi. O homem que sagrado bispo veio para a Paraíba com a recomendação da alta cúria do Vaticano (leia-se cardeal Ottaviani) para não se aproximar de D. Helder, um bispo muito perigoso. O homem que parafernalizado de bispo despojou uma a uma suas vestes episcopais romanas e vestiu a roupa dos pobres. O homem que conversava com as abelhas e falava do seu mel. O homem que nunca deixou de ser ele mesmo e cuja tez foi ficando alva como a de Moisés já perto da terra prometida. O homem que foi meu amigo.

domingo, 27 de agosto de 2017

52 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 52

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52 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 52



Cheguei na reunião do Igreja Nova onde iríamos finalizar e ajustar o início do restaurante para os pobres. Fui com Mírcia minha esposa. Lá estavam presentes Edelomar, Elizabete, Rejane, Sérgio, Antonio Carlos, Clarinda, Strieder, Normândia, Waldemir, Rosilda, Zezé, Adérito e Elzi.
Comecei falando e explicando que estava tudo encaminhado, que amanhã assinaríamos o contrato de aluguel com os Salesianos, que os funcionários já estavam contatados, e tudo mais.
Silêncio geral.
Um silêncio mais frio que o do ar condicionado.
Depois de alguns minutos um começou dizendo que era difícil, assumir empregado, e se não desse certo pagar as leis trabalhistas, outro filosofou 'isso vai desacostumar os pobres a cozinhar em casa, eles já recebem o vale gás', 'os ricos vão comer lá também', 'vão pegar as quentinhas e levar para vender'.... outra disse 'eu não assumo nenhum compromisso desse negócio, não vou para a cozinha, não tenho tempo', e assim por diante. Não colocar o nome do Igreja Nova.
O chão foi se abrindo sob meus pés.
Ainda disse 'mas amanhã vou assinar o contrato...'
O único que disse que podia colocar o nome dele no projeto foi Edelomar. O único apoio que o projeto recebeu por parte do grupo naquele momento, além do da minha esposa.
No cúmulo da insensibilidade, para fechar com chave de esquecimento, uma virou para mim e disse 'escreva logo dois editoriais do Igreja Nova'.
Quem disse que as coisas de Deus são fáceis? E no mundo de Vicente são mais difíceis ainda...






sábado, 26 de agosto de 2017

51 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 51


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51 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 51



Quando o anjo Gabriel chegou ao povoado de Belém, acreditou que sua missão seria muito difícil. Anunciar a uma virgem, muito nova, quase criança, sem família ilustre, num povoado pequeno daqueles, longe do templo, que ela seria a Mãe do Filho de Deus, o Messias e que sua decisão mudaria o curso da história de toda a humanidade. Além do que já tinha visto a reação de sua prima Isabel e de Zacarias...
Qual não foi sua surpresa com o SIM de Maria, sua tranquilidade e sua total disponibilidade à vontade de Deus!
A ideia do restaurante para os pobres estava se vestindo. Depois do forte sinal que recebi na missa parti para procurar um lugar. Alguns dias depois, fazendo o retorno na Av. Abdias de Carvalho na esquina com a Av. Gal. San Martin, vi uma placa de 'aluga-se' no local onde havia um restaurante 'self-service' que agora havia sido fechado a poucos dias. Ficava no terreno dos Salesianos onde há o seminário, a escola D. Bosco e o Parque Gráfico. Fiz a volta no carro e fui falar com o padre João Carlos (SDB).
Expliquei a ideia do restaurante para os pobres, e fomos falar com o encarregado da administração. O local era perfeito pois já tinha um fogão industrial algumas mesas de apoio, um exaustor, que precisavam de conserto. Não havia espaço para servir o almoço em mesas, mas surgiu a ideia de fornecermos a refeição em quentinhas de alumínio com talheres descartáveis.
Tratamos do aluguel e tentei baixar o mais que pude.
Tudo isso eu comunicava ao grupo, e alguns até ofereceram a garagem para guardar o carro e outro para fazer a revisão e consertar.
Pronto, estava mais ou menos tudo organizado. Faltava prepararmos o contrato e assinar.
Procurei saber com amigos advogados, Aderson e Concita Luna se o estatuto do Igreja Nova permitia esse tipo de organização e essa ação de fornecer comida aos pobres com o preço simbólico de 
R$ 1,00 (hum real), sem problemas.
A reunião do Grupo Igreja Nova seria na segunda-feira e assinaríamos o contrato na terça. Assim como Gabriel foi ao templo falar com Zacarias, fui à reunião do meu grupo...
 






sexta-feira, 25 de agosto de 2017

50 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 50

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50 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 50



O anjo Gabriel quando foi anunciar a gravidez de Isabel e depois a de Maria teve duas surpresas, uma ruim e outra boa. Ora, ele pensou que chegando no templo, que era o lugar de oração e devoção, indo falar com o sacerdote escolhido e oficial daquele dia, Zacarias, quando anunciasse o milagre que sua mulher geraria João, mesmo depois de avançada na idade, certamente seria recebido com imenso júbilo de alegria e festa, pois ali se pregava as escrituras e se cobrava a fé das pessoas e se anunciava como servidores de Javé. O anjo certamente não teria problemas. Ledo engano.
Ali teve um dificuldade enorme e a boa nova não foi recebida nem com fé, nem com júbilo, apenas descrença.
A inspiração de se ciar um restaurante digno para os pobres que comiam no terraço da Igreja das Fronteiras, foi uma inspiração do Dom e de Vicente de Paulo. Eu estava penetrando no lado mais difícil da nossa religião cristã: a prática. A ação concreta. A fazer a diferença na vida de quem necessita.
Comecei a procurar doações para montar e manter o restaurante. Falei na missa algumas vezes da intenção. precisava de um lugar para alugar. Pensei que seria mais fácil, pois convivia com gente de Igreja que pregava, estudava, escrevia, divulgava a Palavra de Deus. Percebi que a 'caridade é muito mais pesada que o caldeirão de sopa que se dá aos pobres'. Saí pedindo a um e a outro. Consegui as doações de panelas usadas e utensílios. Uns freezers e um geladeira pouco danificados. 
A dificuldade era grande, então num domingo durante a missa das Fronteiras, eu rezei quase desesperado: 'meu Deus, se não é para fazer me dê um sinal. Mas se é, me mostre um caminho, pois já tentei de tudo dentro das minhas forças'.
O sinal me foi dado. Muito fortemente para não deixar dúvidas.
Ao terminar a missa, uma senhora que eu conhecera no Cursilho me procurou (ela estava participando da celebração, sentada a pouco mais de dois metros de mim) e me disse, exatamente nestas palavras: "Assuero, eu quero que você venha aqui fora que eu tenho uma coisa para lhe mostrar". Eu fui. Lá na calçada lateral da Igreja das Fronteiras ela me mostrou o carro dela estacionado (um Passat 79). "Sim?" disse eu. "É seu". "Meu?" ela respondeu, "sim, é seu, você não está precisando de um carro para o restaurante dos pobres? Pois eu estava rezando na hora da Elevação e pedindo a Deus para me iluminar sobre o que eu ia fazer com esse carro, pois sou a única dona, e o meu consórcio saiu, e eu não queria vendê-lo. Foi aí que tive uma inspiração de doar para seu restaurante! É todo seu, os documentos estão em dia, matriculado. Cuide dele."
Havia dúvida? Para mim nenhuma mais a partir daí... 








quinta-feira, 24 de agosto de 2017

49 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 49


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Missa para os doentes, na Igreja de São Sebastião em Santo Amaro, organizada pelo pessoal de Dois Unidos



49 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 49



Fiquei impressionado pelo que aconteceu na Igreja das Fronteiras, quando prometeram aos pobres que retornariam a fornecer o almoço após a missa, e os pobres foram voltando, e os meses se passaram e nada de almoço. Eu olhava para a imagem de S. Vicente e rezava. Olhava para a imagem de Maria (N. Sra. das Graças que ainda está lá) e me questionava, como na igreja de Dom Helder se prometera aos pobres e não cumpria?
E foi numa dessas orações que me surgiu a inspiração de criar um lugar onde os pobres pudessem comer com dignidade, sem se sentirem humilhados, pudessem escolher a refeição e pelo menos uma refeição por dia que lhes garantisse a necessidade nutricional para 24 horas.
Sabia que poderia contar com meu grupo e com aqueles que anteriormente já forneciam um almoço aos domingos.
Atribuo a Maria e a Vicente essa inspiração, e mais tarde vi que estava certo.
As duas primeiras pessoas que comuniquei a ideia foram Pe. João Pubben e Pe. Arnaldo. Eles concordaram. Depois comuniquei ao pessoal do Grupo Igreja Nova, e eles à primeira reação, como sempre, à uma ideia nova, ficaram reticentes e colocaram algumas questões, mas como sempre também, parti para organizar.
Nessa época estava começando a moda dos restaurantes de R$ 1,00 e era a euforia inicial da vitória de um governo popular.
Falei com frei Aluizio e todos os meus amigos e amigas da Igreja.
Precisaria de um local para uma cozinha tipo industrial pequena, o material da cozinha fogão, gás, geladeira, freezer, panelas, talheres, exaustor, dimensionar funcionários, dimensionar gastos com água, energia, insumos dos alimentos, um veículo para transportar alimentos, vestimentas para os funcionários, obrigações sociais, contador, estatuto, vigilância sanitária, (tudo a nível de pequena indústria e empresa social). Mas isso era e sempre foi acidental, o essencial é a vontade e o espírito de amor aos pobres e a coerência com o que se prega.
No meu coração e na minha mente, estava feito!


terça-feira, 22 de agosto de 2017

48 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 48


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Igreja das Fronteiras





48 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 48


As missas da Igreja das Fronteiras, até hoje, começam às 11h dos domingos. Quando eram celebradas pelo Dom juntamente com o Pe. João Pubben, a comunhão era dada nas duas espécies e não havia o abraço da paz (creio eu, que era porque nessa hora todos iam abraçar D. Helder e tumultuava um pouco o prosseguimento da celebração). Depois da missa havia o almoço para os pobres que era realizado no terraço ao lado da sacristia. A cada domingo um grupo ficava responsável (ora era o Cursilho, ora As Mulheres contra o Desemprego, depois, já no final, o Igreja Nova, sempre com Irmã Catarina). Inicialmente eram cadastrados e causavam um certo tumulto (o que é normal). Depois começou a querer almoçar outros pobres que não estavam na lista. O tumulto aumentava. Incomodou algumas pessoas que administravam a capela. A mão de obra aumentou.
Resolveram fornecer a comida em 'quentinhas' para comerem fora, na rua.
Tumultuaram também porque deixavam na entrada da Igreja muito lixo.
Estava se tornando um transtorno.
Depois começaram a falhar no fornecimento do almoço. O pessoal faltava e os pobres ficavam sem almoço. Era no final de 2002.
Então, numa bela manhã, após a missa, anunciaram para os pobres (havia uma imagem de S. Vicente de Paulo no altar lateral, que o Dom gostava muito e muitas vezes fazias orações) que estavam suspendendo temporariamente as refeições, para se organizar melhor e que breve, voltariam a dar o almoço.
Nesse dia os pobres foram despedidos de mãos vazias.

sábado, 19 de agosto de 2017

47 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 47


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1-  D. Gailot ao centro, com Frei Aluizio Fragoso, Nomândia e Gorete


2- Padre Libânio na sua palestra "Testemunho no Cristianismo Latino-Americano"

                                        3- Racine Ravel na apresentação cultural da III Jornada

47 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 47



O ano 2000 foi um ano de desencanto. Nem a miséria desapareceu, nem houve o bug do milênio. Mas a ousadia e os sonhos não desapareceram e aí eu sonhei mais alto ainda: trazer nosso primeiro palestrante internacional. Salvo engano da memória conversando com Frei Aluizio pensamos em D. Gailot, um bispo perseguido na França, pelo Vaticano, ao qual foi dado uma diocese que não existia mais fisicamente, Partênia, mas que se tornou uma diocese virtual (naquela época o mundo virtual era incipiente ainda). O grupo pensou que eu estivesse delirando. as dificuldades de sempre, convencimento do convite, dinheiro, hospedagem, e tudo mais. Foi tudo superado, ele aceitou bem, conseguimos uma pessoa maravilhosa chamada de Peg que morava aqui em Recife e traduziu tudo para nós. D. Gailot foi um dos pontos fortes das nossas jornadas. Na casa de Hercílio e Maria Helena  ele e João Batista Libânio nos propiciaram uma noite maravilhosa de conversa descontraída. Lembro que ele negou-se a cantar o hino da França por se tratar de tema com a violência.
Os outros palestrantes da terceira Jornada foram: Marcelo Barros, frei Betto e a querida Ivone Gebara. As atrações culturais Maracatu Infantil Nação Erê, Ravel e Racine canto e violão, Grupo Boca de Forno, Mulheres contra o desemprego, e o Coral da Chesf. Ivone falou sobre "Igreja, Mulher e Esperança".
Neste ano morreu D. Jerónimo Podestá e Pe. João Pubben proferiu uma bela homilia em sua memória que foi publicada no Igreja Nova. Também saiu nessa edição:

Escolhido pela Santa Sé para ser bispo auxiliar desta arquidiocese, o beneditino D. Fernando Saburido, foi o penúltimo padre ordenado por D. Helder. É tido pelos seus colegas, pelo clero em geral e pelo povo de Deus da sua paróquia como um homem bom, afeito ao diálogo e humilde de coração.
Esperamos que ele mantenha seu espírito e que permitam-no desenvolver um trabalho frutífero nesta arquidiocese, sendo uma janela aberta ao diálogo para com todos. Receba nossas orações.
Uma profecia que está se cumprindo.

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

46 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 46

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Frei Betto com D. Helder na primeira Jornada Teológica 

46 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 46


Outro bispo auxiliar de D. Cardoso foi D. João Evangelista Terra. Era o verdadeiro leão de chácara do arcebispo. Tomava todas as dores e ia à imprensa, já que o outro não falava mais nos meios de comunicação pois se dizia vítima de perseguição. Tive pouco contato com D. Terra. Era jesuíta e bibliófilo, tinha uma verdadeira mania por livros; quando partiu daqui para Brasília levou um caminhão daqueles tipo baú, cheios de livros, inclusive os de Pe. Arnaldo que tinha-os doado para a biblioteca do seminário de Olinda.
Foi D. Terra que teve a ousadia de telefonar para D. Helder  transmitindo a ordem de D. Cardoso, para que se mantivesse calado sobre a questão do Morro da Conceição e sobre tudo mais que a Arquidiocese promovesse.
Vejam que D. Helder foi perseguido extra e intra eclésia. 
O amor entre D. Terra e D. Cardoso não durou muito. A mãe do auxiliar veio ficar com ele uns tempos, uma senhora já idosa. Pois bem, o motorista do arcebispo a deixou esperando no Shopping Recife por horas sem ir buscá-la. Quando se providenciou  sua condução para o Palácio dos Manguinhos, Judite, a irmã do arcebispo que controlava tudo, a deixou sem comida, apenas com algumas bananas e água. Foi a gota d`água.
Por falar em livros, Pe. Arnaldo, um dos poucos padres que conheci que vinha de uma família abastada (seu pai era dono de engenho em Escada, município da Mata Sul), esse sim, gostava de ler e se manter atualizado, comprava livros desde que era seminarista, chegando a manter correspondência com uma livraria especializada em Paris que lhe enviava as novidades quando editadas, entre livros e revistas teológicas e eclesiológicas (ele nunca me revelou a quantidade aproximada de livros e revistas que deixou para o Seminário, mas se falava entre 10.000 e 15.000).
D. Terra partiu sem deixar saudade. Um jesuíta me contou, que no sul, quando ele foi transferido, os seminaristas soltaram uma bombinha embaixo do veículo dele, só para assustá-lo.

quarta-feira, 16 de agosto de 2017

45 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 45

45

 

                                                   com D. Gílio na primeira Jornada Teológica

45 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 45




D. Cardoso era naquela época um homem de hábitos estranhos. 
Adorava café, porém só o bebia até meio-dia pois dizia que se tomasse após esse horário não teria sono. Mantinha um exemplar do meu livro "Réquiem para um Bispo" na estante da sua sala no Palácio dos Manguinhos, e aliás, havia também um exemplar no Colégio Pio Brasileiro em Roma.
Mais estranho ainda, o nosso bispo só tomava cerveja quente (ao natural). Uma vez voltando de carro de uma viagem longa do interior de Pernambuco, se não me engano de Afogados da Ingazeira, pararam no meio do caminho, num bar desses de beira de estrada, já de tarde, muito calor, com fome e sede, e ele se dirigiu ao garçom "me traga uma cerveja, só se estiver quente, a mais quente que o senhor tenha", o garçom ficou pensando tratar-se de alguma brincadeira, mas ele insistiu seriamente. Pois bem, trouxeram-lhe uma cerveja bem quente e ele tomou. A pessoa que estava com ele perguntou por que ele gostava de cerveja quente, a resposta foi a mais inusitada possível "eu aprendi com os animais. Quando eu era bispo de Paracatu, depois do almoço eu me sentava no terraço e via os bois vindo beber água nas poças da rua em frente de casa".
Seus bispos auxiliares D. Hilário Moser (salesiano) e D. João Terra (jesuíta)  não aguentaram muito tempo a companhia. O primeiro mudou-se logo para o seminário e vivia humildemente longe de D. Cardoso. Certa vez fui buscá-lo para um encontro de Igreja e fui abrir a porta do meu carro, ele me disse "meu filho, não precisa, eu sou simples, lavo meu próprio banheiro..." sofreu muito aqui. Depois foi ser bispo na diocese de Tubarão em Santa Catarina.
A irmã de D. Cardoso chamada Judite era quem administrava o Palácio e as más línguas diziam 'a Arquidiocese'.
O caso de D. João Terra é mais complexo e merece uma narrativa mais completa.

domingo, 13 de agosto de 2017

44 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 44



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Félix no lançamento







Edmílson, Patrícia e Débora



44 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 44



Réquiem para um Bispo, foi o título do livro que lancei em 1997. Meu segundo livro. Foi lançado na Bienal Internacional do Livro aqui em Pernambuco, no Centro de Convenções. Qual não foi a minha surpresa com o presente que Pe. João Pubben me deu: primeiro que qualquer um, antes mesmo de iniciar estava lá Pe. João e D. Helder para comprar o primeiro e segundo livro ! Muita emoção. Pena que não tenho nenhuma foto desse encontro. Muita honra e alegria.
Esse livro passei mais ou menos  uns dois anos para escrevê-lo. Inspirei-me em histórias reais de pessoas amigas e outras nem tanto e teci uma trama, contada em quatro níveis de entendimento.
Pode-se ler apenas como um romance novelesco, pode-se ler pulando os capítulos as histórias das personagens, pode-se ler ainda como uma discussão filosófica e ainda como um pequeno tratado de visões teológicas.
Padre Arnaldo disse que o padre Daniel Lima o leu o o considerou excelente (nunca o conheci pessoalmente). Essas personagens do livro são todas baseadas na realidade, como já disse, a maioria já está no aconchego do Pai. Lá estão inspirações de D. Helder, D. José Cardoso, D. Francisco Austregésilo, D. José Maria Pires, Luiz Antonio, frei Aluizio (que escreveu uma belíssima contra-capa), Edmilson Furtado, Fernandinho, Antonio e Helena, Ivone Gebara, Strieder, o pessoal do Igreja Nova, minha sogra, esposa, filhos, Reginaldo Veloso, Paulo Teles de Menezes, o pessoal do Morro da Conceição, D. Paulo Evaristo Arns, dos vigários de D. Cardoso, de Romeu, Edwaldo, Arnaldo, José Augusto, Cremildo o eterno monsenhor, D. Abade....
A história se inicia com o falecimento de minha sogra e termina com o nascimento da minha filha. Há um fio de narrativa que consiste na obsessão pastoral e administrativa de D. Acab (o arcebispo da história) querer construir na igreja de Olinda e Recife um grande cemitério... um padre pensou que era verdade e veio me perguntar se D. Cardoso estava querendo mesmo construir um cemitério exclusivo para católicos praticantes... ri muito.


sábado, 12 de agosto de 2017

43 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 43



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43 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 43



Continuando com a reflexão anterior, no dia 28 de agosto de 1999 cheguei pela manhã na Igreja das Fronteiras e havia muita gente já ao redor do esquife do Dom que estava perto do altar.
Vou postar minhas fotos pessoais:




Ao centro está Maninha (Nair Camara), à direita Irmã Catarina e à esquerda Zezita.

A igreja das Fronteiras já estava cheia desde essa hora:



Lá fora na rua Henrique Dias também começava a se aglomerar seus admiradores:



O cortejo fúnebre saiu à tarde, com o pessoal indo a pé na sua maioria, pela Rua D. Bosco, Av. Agamenon Magalhães, Olinda até a Sé.





Ao chegar na Catedral da Sé houve um pequeno contratempo pois nem todos puderam ver o sepultamento de perto devido a total falta de espaço. Apenas algumas pessoas. Notem que o caixão foi envolto com a bandeira do MST:



Posso identificar o padre Josenildo em primeiro plano e lá atrás Pe. Albérico, mas foi grande a quantidade de padres e religiosos, leigos, diáconos, mesmo aqueles que o perseguiram, D. Helder conseguiu unir a todos.

Estive no seu sepultamento (no chão da nave central em frente ao altar) e na sua exumação (26 de agosto de 2012) para o traslado de seus restos mortais para seu túmulo definitivo na mesma Sé de Olinda ao lado de D. Lamartine e do Pe. Henrique.

Registro minha eterna gratidão a D. Fernando Saburido, quando atendendo a um pedido, permitiu que a lápide que esteve tantos no primeiro sepulcro fosse levada para o jardim interno da Igreja das Fronteiras, um local que o Dom tanto apreciava e onde passou bons momentos de sua vida em oração e reflexão.





sexta-feira, 11 de agosto de 2017

42 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 42

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42 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 42



Participava tanto de encontros de grupos da teologia da Libertação quanto de Oficinas de Oração, Renovação Carismática, Encontro de Casais com Cristo. Boas amizades em uma caminhada constante. Cito Tarso e Zeza, Raimundo e Emília, Leonardo e Guilhé, Fred e Vilma, Bravo e Taciana, Oreste e Ana, Otávio e Virgínia, Mauro e Jaciara, Toni e Flávia, Newdão e Cândida, Zimone e Socorro.
Logo após a II Jornada D. Helder faleceu.
Quando cheguei às Fronteiras já estava muita gente na igreja com o velório ao centro. Há pouco tempo procurei averiguar com testemunhas presenciais os últimos momentos do Dom aqui na Terra, pois cada um conta uma história diferente e sempre diz estar presente nessa hora. Vou transcrever o artigo:
“Hoje é 27 de agosto de 1999. Pe.  Joãzinho  (João Pubben CM) acabou de sair para sua comunidade de Dois Unidos. Esteve aqui comigo, como sempre, quase o dia todo. Irmã Catarina (Catarina Damasceno FC) saiu para descansar. Pela manhã olhou para mim e eu olhei para ela, demoradamente. Estou sem falar. Não aceitei alimento algum. Alguma dor no abdômen que me incomoda. Ela disse a mim –Contou uma história não foi Dom? aí eu respondi ‘ FOI’. Essa foi a última palavra que disse, na minha última manhã. Agora é noite. Está tarde. Estou sereno. Minha cama foi colocada aqui na sala da minha casa na sacristia da Igreja das Fronteiras. É uma cama larga, de hospital. Quero dormir. Ao meu redor pessoas queridas, Zezita, minha cara secretária de tantos momentos (Maria José Duperron Cavalcanti), as irmãs de Caridade Maria José Dantas Coutinho, Leonete Custódio, Josefina Souza, Maria de Fátima Nascimento, Lucimar Pereira, Maria Emília de Barros, o enfermeiro e Gercino Rufino de França.
É noite e estou cansado. Irmã Josefina me pede para lembrar junto ao Pai, da Congregação das Filhas de Caridade, das irmãs, de todos. Como iria esquecer? Ah meus pobres, meu pobres. Catarina chega e está pedindo para levantar um pouco a cama. Rezam um Pai Nosso. Agora é noite. Já é 22h e 19m.”
Quando D. Helder abriu os olhos foi no Dia pleno.
Aqui, na nossa madrugada, Pe. João voltou correndo de Dois Unidos. Lucinha Moreira retornou apressadamente. Na Igreja da Sé em Olinda, Gilvan tocou o sino e avisou as pessoas que acorreram para ouvir a notícia ‘Dom Helder acaba de morrer’. Em seguida trouxe os paramentos que Paulo VI havia presenteado ao Dom para vesti-lo. Pe. Edwaldo Gomes chegou primeiro às Fronteiras, Pe. João Pubben em seguida e Pe. José Augusto Esteves. Mardônio Camara e Maninha (Nair Camara) que foi trazida às pressas do Rio, onde morava, haviam assinado um documento no qual expressavam formalmente o desejo de D. Helder de ser enterrado no mesmo dia e da maneira mais simples. Quando ela chegou pediu para ficar com o terço que estava na mão do Dom e que fora um presente de João Paulo II e entregou o seu próprio para por no lugar.
Quando cheguei, logo cedo, uma verdadeira multidão já estava na Igreja das Fronteiras e em toda a rua.
A missa foi celebrada por Jesus e presidida pelo Núncio.
Aqui a madrugada continua.


quinta-feira, 10 de agosto de 2017

41 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 41


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41 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 41


Em 1999 realizamos a II Jornada Teológica, desta vez em diante chamada de D. Helder Camara.
Mais uma vez Frei Aluizio conseguiu o auditório da Fafire, na Conde da Boa Vista. Como da primeira vez foi um sucesso, tanto de público e principalmente de conteúdo. Ali a Igreja de Olinda e Recife reacendia sua luz. Foram em média mais de quinhentas pessoas por noite.
Eu havia começado a pensar nela um ano antes, desde o início da primeira. 
O nome de D. Helder abriu portas. Consegui patrocínio através do Frei, de João Pubben, Pe. Arnaldo, Pe. Renato do SCJ. 
D. Helder não pode comparecer por motivo de saúde já bem debilitado, mas Pe. João nos trouxe uma carta dele saudando a todos.
Muito trabalho para conseguir os palestrantes, pois a cada ano procurávamos superar o anterior. Minha ideia foi a de valorizar também a atração cultural pois uma coisa reforçava a outra, pensei em uma hora para cada e a palestra sem preguntas, mas fui vencido. Aos poucos o grupo foi diminuindo o tempo da apresentação e aumentando o das perguntas depois das palestras. Eu sempre temi a questão das perguntas após, pois na verdade as pessoas querem fazer outra palestra própria e aproveitar o holofote. Foi o que foi acontecendo e depois da palestra o auditório esvaziava e eu ficava constrangido de ter convidado pessoas ou grupos para apresentação cultural, que vinham com grande sacrifício, pois eram pessoas pobres na sua maioria e recebiam apenas um cachorro quente e um copo de refrigerante.
Leonardo Boff fez abertura falando sobre seu livro ícone Jesus Cristo Libertador, que muita gente pensava que dera início à teologia da Libertação, mas quem é o pai é Gustavo Gutierrez (ainda tentei trazê-lo por duas vezes, mas ele era cadeirante e com dificuldades de saúde, nunca veio).
A apresentação cultural foi da orquestra dos Meninos de São Caetano que vieram dessa cidade do interior com seus instrumentos, o maestro fundador e uma estudante de música (o maestro havia sofrido calúnias por represália política), lembro que teve alguém do nosso grupo que reclamou porque pagamos a gasolina do ônibus.
A segunda noite foi a vez de D. Gilio Felicio, um bispo negro, fundador do movimento dos agentes de pastorais dos negro e na época bispo auxiliar de Salvador na Bahia. Atualmente é bispo de Bagé. Um excelente pessoal, pastor de primeira ordem, o tema foi Teologia do Rosto Negro. e a apresentação foi um balé com a Missa Afro.
A terceira noite foi D. Waldyr Calheiros que atendeu um convite meu em nome de Pe. Arnaldo. Bispo de Volta Redonda, um cabra macho que enfrentou de peito aberto os militares daquela época em defesa dos trabalhadores. Dos bispos que conheci era o que falava de maneira mais aberta e numa linguagem bem simples.
A apresentação da noite que antecedeu a palestra foi o Quinteto de Cordas.
A quarta noite foi de Marcelo Barros com a palestra "Culturas em Comunhão Libertadora" e a atração cultural foi o Quinteto de Metais.
Para finalizar a II Jornada na sexta-feira, Frei Betto teve o tema "Fé, Política e Libertação" e a apresentação foi do Balé Perna de Pau. 
O espírito de D. Helder perpassou toda a Jornada, nas palestras, nas apresentações, no lançamento do livro Helder, o Dom, organizado por Zildo Rocha com artigos e reflexões de vários teólogos.
Ao final já estava pensando na próxima. Muito trabalho, muita inspiração e engajamento de todos. Foi a última com D. Helder entre nós... 








quarta-feira, 9 de agosto de 2017

40 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 40


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40 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 40


O grupo Igreja Nova tornou-se um grupo eclético. Havia pessoas mais dedicadas ao jornal, outras às jornadas e algumas ao curso de teologia para leigos que depois batizamos de 'D. Helder' e que constava de palestras semanais, como já relatei no início dessas postagens.
Havia um núcleo que trabalhava mais no sentido de se dedicar a todas essas vertentes. A ideia de se aproximar de D. Helder e de sua obra e do IDHEC foi muito feliz e rendeu muitos frutos. A luta contra os desmandos de D. Cardoso continuava porque ele também continuava, foram mais de vinte anos.
Os jovens foram ficando mais 'velhos' e com as novas condições de vida (família, trabalho, estudos) foram se afastando embora admirassem à distância o nosso trabalho. Permaneceu apenas Fernandinho. No grupo, como em qualquer grupo humano, inclusive entre os apóstolos (havia um núcleo mais próximo a Jesus, Pedro, Tiago e João, e que disputavam o poder) houve uma crescente tensão entre duas participantes e eram as duas que mais trabalhavam. Isso me preocupou muito e chegamos até a fazer um encontro com uma psicóloga para trabalharmos mais essa questão, porém foi infrutífero. Tensões sempre haverão, conflitos e disputas emocionais, isso faz parte da natureza humana, o problema é quando prejudica o coletivo.
O jornal ganhava credibilidade e tínhamos colunas, artigos, reportagens, notícias e 'centelhas' que mostravam o lado secreto das paróquias e da arquidiocese. Colaboradores de nome nacional e até internacional. A tiragem aumentava. A cada mês eu saía distribuindo nas bancas de revista da Av. Guararapes (Banca Globo), na Torre, em Olinda, nas editoras Vozes , Paulinas,Paulus, na Unicap, em algumas paróquias (Espinheiro, Torre, Madalena, Boa Viagem, Piedade, Pina, Brasília Teimosa, Morro da Conceição, Belém, Campo Grande, Várzea, Franciscanos da rua do Imperador), enviávamos para padres de outras dioceses Paraíba, Maceió, Natal, Rio de Janeiro, São Paulo, ainda para o Canadá, França, Alemanha.
Distribuía ainda em diversas congregações e ordens. Nas saídas das missas e nos encontros católicos.
Conseguimos criar uma identidade própria. Preocupado e pensando que iríamos mais longe ainda registrei a 'marca' Igreja Nova no Instituto de marcas e patentes, na época na Cidade Universitária, que me custou muito pouco.
Três coisas ainda me preocupavam como grupo cristão: não estava havendo adesão de mais ninguém (sinal de fechamento), a espiritualidade como grupo e a ação concreta em favor dos pobres. Em contrapartida tínhamos um sistema de organização anárquico (no sentido de governança) a princípio, e não tínhamos nenhuma ingerência político partidária, também a princípio.



terça-feira, 8 de agosto de 2017

39 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 39

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39 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 39 



Em agosto de 1995, estive, a convite do Pe. Luiz Antônio, em Juazeiro da Bahia, para a festa da sua padroeira N.Sra. das Grotas. Fomos de carro, eu Luiz, os seminaristas Hugo, Helio e Gilvan do seminário de João Pessoa. Muito chão, mas valeu a pena. Fomos além de festejar a padroeira, nos encontrar com D. Paulo Evaristo Cardeal Arns. Amigo pessoal e quem ordenou Luiz Antônio em São Paulo.
Uma viagem longa de carro, mas no caminho tivemos oportunidade de conversar bastante sobre nossas história de vida, o que rendeu ótimos capítulos do livro Réquiem para um Bispo.
Chegando na véspera, pude desfrutar da companhia de D. Paulo, na casa ´palácio´episcopal. Sentamos lá mesmo na cozinha e conversamos muito e ele mostrou alguns livros dele e eu mostrei o Jornal Igreja Nova. Fiz uma entrevista muito boa, que publicamos no número de setembro deste ano.
Na celebração estavam também o bispo de Juazeiro, é claro e D. Paulo Cardoso (irmão de D. Cardoso) bispo de Petrolina.
Vocês sabiam que o único lugar no mundo, que eu tenha conhecimento, onde existem duas dioceses tão juntas, separadas apenas por uma ponte e de onde uma avista a sede da outra é Petrolina e Juazeiro?
A entrevista constou de reflexão sobre a Nova Era (no auge desse movimento), sobre a esperança para a situação do país, sobre a questão de bispos nomeados descomprometidos com o povo, e uma mensagem para Olinda e Recife. Lembro de uma frase lapidar que ele disse 'creio sempre que o povo converte o bispo'.
Nesse tempo, é bom lembrar, havia esperança de um futuro melhor para o país, e acreditávamos piamente que o PT com a bandeira da ética e do compromisso com o direito, a justiça social e as reformas, traria uma luz para a nação...
Algum tempo depois, na casa de Antonio Carlos, tive oportunidade de conversar com Plínio de Arruda Sampaio e ele me dizia "Assuero, temos que tomar a direção desse partido das mãos daquele pessoal de São Paulo, estão se desviando, estão assaltando o Partido. Eu escrevi o estatuto de meu próprio punho e agora veja o que está acontecendo..."
Foi a última vez que vi pessoalmente tanto D. Paulo quanto  Plínio.

segunda-feira, 7 de agosto de 2017

38 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 38



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38 Minhas memórias da Igreja de Olinda e Recife 38



A vida de D. Helder é incrivelmente rica de detalhes, de histórias, de interações com a vida do outros. O que mais me impressiona nele (para mim ele continua vivo) é a coerência da sua pregação, da sua crença pessoal e da sua atitude de vida. Era o mesmo na intimidade como na vida pública. Extremamente pudico, praticava uma ascese toda própria ao submeter sua vida a uma rotina monacal.
Quando publiquei o livro Partindo de Emaús, certa vez sabendo que D. Helder estava na Matriz do Espinheiro com Pe. Arnaldo, peguei um exemplar e pedi para que o Dom escrevesse algo, uma espécie de dedicatória para mim mesmo para eu guardar. Ele olhou para mim, olhou para Pe. Arnaldo, olhou para o livro, olhou para cima, e depois de uns minutos escreveu apenas "+ Helder Camara".
Pe. Arnaldo depois comentou comigo 'estás pensando que o velho (o chamava assim de maneira carinhosa como a um pai) não está ligado nas coisas?' Como eu batia muito de frente com as atitudes de D. Cardoso...
Nesse dia (era de tarde) ele e padre Arnaldo ficaram esperando um casal que tinha combinado com o Dom para que batizasse o filho ali no Espinheiro. Pois bem, demoraram mais de três horas. Pe. Arnaldo já estava revoltado com a demora e o descaso do casal para com D. Helder, que nessa época já estava fragilizado. Queria suspender, mas o Dom não deixou, e com toda paciência recebeu a família e batizou a criança. Quem conhece Pe. Arnaldo sabe como era pontual. Nessa tarde ganhei um lenço que D. Helder deixou lá com Pe. Arnaldo.
Outro episódio interessante, acontecido bem antes, no qual o arcebispo argentino D. Jerónimo Podestá veio aqui ver e conversar e se aconselhar com o Dom. Veio acompanhado de Clelia, sua secretária. D. Helder chamou o Pe. Félix e pediu para que acompanhasse os dois enquanto aqui estivessem. 'Mostre a eles os mocambos e alagados, os morros. A periferia, mas mostre também o lado bonito da natureza, as praias'. Tudo bem. Félix foi com eles e assim fez. Não lembro agora qual foi a praia. Depois, quando voltaram, D. Helder perguntou ao padre se havia mostrado tudo, ao que ele respondeu que sim, mas que havia acontecido uma coisa estranha, pois no final o bispo entrou na praia com a secretária.... D. Helder não deixou ele continuar e disse, vamos rezar por eles.
Na verdade Podestá e Clelia vieram pedir conselhos ao Dom sobre o romance dos dois, ao que o Dom teria dito que iria rezar pelos três. 
Tempos depois assumiram publicamente, ele renunciou ao seu bispado na Argentina, conheci-os pessoalmente quando vieram uma segunda vez. Clelia veio outra vez e lançou um livro. 
Ele tornou-se um dos raríssimos casos de bispo casado, defendeu o movimento dos padres casados, mas além de tudo foi um grande nome na Igreja da América Latina. Morreu pobre e esquecido e o único membro da Igreja Católica que foi visitá-lo no hospital em Buenos Aires (2000) foi Jorge Mario Bergoglio.