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segunda-feira, 29 de outubro de 2012

O Resto de Israel


 
 
 
 
 
O Resto de Israel            

 

 

Para ser o resto de Israel é necessário descer as montanhas, é necessário segurar a manhã com a mão e molhar o chão com o suor do próprio corpo. Para ser o resto de Israel é preciso não temer, não ter mais nada a perder, cultivar solitário a última figueira e dela esperar um único fruto.

Para ser o resto de Israel não basta simplesmente ser católico, há que ser cristão e se reconstruir o templo do coração, em carne e misericórdia. Para ser o resto de Israel, chorar é preciso e navegar nas lágrimas da última quimera desfeita, é ter certeza que a mão que afaga jamais apedrejará. É atender o pobre, é cuidar do ferido, é servir a mesa do indigente, da viúva e do órfão, e sempre que tiver feito tudo ao seu alcance, sentir-se como um servo inútil.

O resto de Israel é como a última semente, na terra ressequida, esperando uma gota de chuva. É como a arca do ancião que navegou em águas tenebrosas e viu a criação ser quase toda destruída e mesmo assim jamais perder a esperança, pois ela mesma é a esperança. Ser o resto de Israel é brigar com Deus para subir a escada que dá no paraíso e não conseguindo vencer a Deus, sair ferido na coxa para sempre, e mesmo assim não desistir.

O resto de Israel trás dentro de si a certeza de Abraão e a liturgia de Melquisedec. Carrega consigo a ternura de Maria e o medo dos discípulos. Tudo espera, tudo crê, tudo conforta. É amável, humilde e puro. É terra e é água. Não se assombra com dificuldades, não teme o futuro, não se desola mais. É a última semente da Terra. Nela Deus vai colocar seu sopro.

Para ser o resto de Israel é preciso amar...

Amar sem medidas e sem pudores, sem limites. É suportar amar sem ser amado e mesmo assim sempre procurar o melhor para sua amada, a pequena nação, às vezes de uma só pessoa.

Para ser o resto de Israel é necessário sobreviver. Com cruz, com espada, com o ferro do suplício, com os espinhos e com a brasa. Um só caminho, uma só direção e o infinito como terra prometida e sempre que olhar, vendo o deserto, acreditar que logo mais, após a primeira duna, surgirá o leite e o mel derramado de montanhas e vales verdes.

Para ser o resto de Israel é, mesmo cego, caminhar procurando a luz e saber que mesmo sem a ver, ela lhe encontrará com a certeza de um predestinado, pois no resto de Israel é onde Deus colocou seu coração. É tateando tocar na chaga da necessidade do pobre e ali ver que está tocando na chaga do próprio Cristo, porém não adorá-la, mas apressar-se em cuidá-la.

É ter a certeza num mar de incertezas que valeu a pena, pois o coração de Deus, está no resto de Israel.

 

Assuero Gomes

Médico e escritor


 

 

 

 

domingo, 28 de outubro de 2012

NA PERSPECTIVA DO PRÓXIMO NATAL...


 
 
 
 
 
 Reflexão enviada pelo amigo e irmão Pe. reginaldo Veloso
 
 
NA PERSPECTIVA DO PRÓXIMO NATAL...

 

A você, Assuero,

a vocês, amigos e amigas, muito queridos e queridas,

estarei enviando, a partir de hoje, alguns pontos de reflexão que poderão ajudar na preparação do próximo Natal.

 

E o primeiro é este, sobre o que anda acontecendo no mundo globalizado. É de um professor da UFC, gente muito séria e profunda. A pergunta final nos desafia...

 

Reestruturação regressiva

 

Um tema que é hoje objeto de grande polêmica é o do alcance e do significado para a  humanidade como um todo da crise que enfrentamos. O economista paulista Beluzzo a interpreta com razão não simplesmente como uma crise econÿmica, mas como algo que afeta radicalmente a civilização, seus valores e seus ideais, que se lutou por construir no pós-guerra. A crise significa em primeiro lugar o abandono dos sonhos de humanização que marcaram tantos movimentos e tantas lutas, o sonho da igualdade, da construção de uma vida social radicada na universalização de direitos e no objetivo de alcançar  o bem-estar social para todos. Sua raiz está num novo individualismo que tem como base social a grande classe média que se gestou na longa prosperidade e nos processos igualitários que marcaram a época do capitalismo de orientação keyn esiana, ou seja, aquele em que o Estado assumiu como sua tarefa primeira não só ser o promotor do crescimento econÿmico, mas o instrumento de efetivação da universalização dos diretos.

Ora o individualismo renovado vai pÿr como grande valor da vida humana a competividade: todos são convocados a serem empreendedores e a competividade se encarrega de produzir o progresso e o bem-estar. Isso levou ao surgimento de milhões de empresários terceirizados e autonomizados que produziram mudanças profundas nos métodos de trabalho e na organização das grandes empresas. Isso significa que que a ordem internacional se configura  a partir de outros valores: a competitividade do capital financeiro e produtivo constitui seu eixo articulador e neste novo contexto o que realmente conta é o empenho agressivo e a capacidade de liquidar os outros. O verdadeiramente assustador aqui é que a competitividade não é apenas a categoria central do mundo dos negócios, mas ela se está transformando no valor cultural fundamental e enquanto tal passa a reger as diferentes relações sociais. A visão da economia e da sociedade subjacente a esses processos defende explicitamente a tese de que a vida humana é marcada pela concorrência darwinista de tal forma que o que na vida está em jogo em última análise é a sobrevivência do mais forte.

O espetáculo que presenciamos nas últimas décadas é o de uma ofensiva gigantesca do capital frente ao trabalho efetivada através da flexibilização, da terceirização e da precarização. É como se o capital se vingasse das conquistas do Estado de bem-estar social, uma espécie de libertação do capital que livre da intervenção estatal consegue agora estabelecer o mercado como definidor das regras de toda a vida social. É justamente a intervenção estatal, sobretudo sua prerrogativa fiscal, que é hoje objeto de uma crítica violenta: resiste-se a qualquer interferência no processo de diferenciação da riqueza, da renda e do consumo vigente n o mercado capitalista.

Esse processo é acompanhado por uma reviravolta ética: a ética da solidariedade é substituída pela ética da eficiência o que conduz a uma radical rejeição dos programas de redistribuição de renda e assistência a grupos marginalizados. Caminhamos para a barbárie?

 

Manfredo Araújo de Oliveira  UFC 

 

Tudo quanto cheira a "competição", como prática ou metodologia... e a "competitividade", como valor, a começar pelos jogos e brincadeiras de crianças, pelo futebol nosso de cada dia, há muito tempo que me acende, pelo menos, a luz amarela... E será que não deveria acender, definitivamente, a luz vermelha?...

 

O Natal que se aproxima, nos convida a quê?... Nos sugere o quê?...

 

Grande abraço, Reginaldo Veloso

 

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

O perdulário


 
 
 
O perdulário

 

Quem está por detrás de um país que esbanja seus recursos naturais, que desperdiça milhões de quilos de grãos e milhares de toneladas de hortifrutos de sua produção agrícola, jogadas às estradas do descaso, e que no mesmo movimento permite que suas crianças comam lixo disputando com cães e urubus as carnes podres?

Qual país que desmata continentes de florestas e chora porque perdeu uma partida de futebol? Quem assanha a sanha arrecadatória de tributos, que escorre nos ralos de imensos buracos negros da corrupção? Elejamos um personagem símbolo dentre tantos, verdes amarelos. Um daqueles nascidos ‘na barriga da miséria’, que com muita sorte e esforço consegue escapar de um destino severino. Envereda-se nos sinuosos caminhos da política, desde a escola, traz um discurso comprometido, traja uma roupa coerente, calça sandálias de caminhar. Com os ideais e a ideologia, carrega consigo um imenso, profundo e amargo sentimento de inferioridade. Segue sua trilha, e um entre mil, bafejado pela sorte, consegue algum cargo em alguma organização. Articula, cede, manipula, é manipulado, entra na dança do poder, é seduzido.

Agora o discurso precisa ser moldado à nova situação. As sandálias cedem ao cromo alemão. Os jeans surrados ao Armani. A mulher, companheira e camarada de tantas batalhas insones de noites de estômagos vazios, deve ser trocada por uma mais nova, bem mais nova, ‘apresentável’. Festas de representação com bebidas importadas, mordomos, imprensa, spots, flashes. Automóvel importado, motorista, segurança. O limite para o gasto, com o numerário alheio da arrecadação das taxas, impostos, contribuições, é o delírio de se olhar no espelho e se ver um poeta como Nero. O ego tão inflado, mas tão inflado, que quase sufoca o peso da inferioridade, que está dentro de si, e esta vai se exacerbando mais e mais, à medida em que ele tenta camuflá-la na ostentação. E assim o nosso patrício vai introjetando o poder (que não tem) dentro si de tal forma que é escravizado por ele. Vai perdendo a noção do custo, do valor e do preço das coisas. Sua alma acaba valendo menos que o pó sob o sapato que usa e sua palavra menos que a água suja que escorre no esgoto.

Assim o nosso ‘herói’ vai atravessando a vida achando natural que tenha quarenta empregados sob suas ordens, que ganhe mil vezes mais que um assalariado, que se mate de morte violenta no seu país, mais que a população de duas cidades de porte médio, por ano, que se aumente a carga tributária e não se tenha escola digna, nem saúde pública, nem transporte, nem segurança nenhuma, para os filhos da pátria amada, mãe nem tão gentil.

Nem mesmo acha estranho que o Primeiro Ministro da Inglaterra lave seus próprio pratos e sua esposa passe as roupas de casa, e apronte os filhos para a escola, pública.

 

Assuero Gomes


Médico e escritor

 

 

 

 

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

PAZ


 
                                           detalhe do mural Tributo a Gaudí do Simepe
 
 
 

PAZ

 

Há a paz dos dormitórios, dos crematórios e dos cemitérios. Há a paz dos obedientes, calados, dominados. A paz dos indolentes. A paz dos mosteiros do Tibet e de Olinda. A paz das salas de aulas nas férias, dos parques de diversão após as catástrofes, a paz de Hiroshima e Nagasaki após.

Há a paz entre uma guerra e outra.

A paz intransponível dentro de uma fortaleza ou de um castelo com fosso profundo e ponte levadiça suspensa. Há a paz dos desertos claudicantes e a paz dos descerebrados.

Qual a paz que queremos?

A paz da milícia, da população trancada. A paz do coração indiferente e da conta de banco confortável. A paz do ‘shopping’ e do ‘alphaville’, da consciência inconsequente e do isolamento perpétuo. A paz dos conformados.

Jesus vai nos transmitir sua Paz: - A Paz esteja convosco!

A paz da solidão profunda ou do anonimato, será paz? A paz do relativismo e do sono de tranquilizantes. A paz contemplativa da abstração eterna...

Qual a Paz de Jesus?

A Paz de Jesus é a plenitude das necessidades contempladas.

Saúde, fartura, água transbordante, alimentos em abundância, amenidade climática, fraternidade, compaixão, segurança, cultura, moradia digna, vestuário decente, mobilidade, cidadania plena, alegria, ternura, acolhimento, liberdade.

Essa paz, a de Jesus, só a conseguiremos através da fraternidade, da justiça e da comunhão.

É a Paz que de uma leva de escravos se constrói um povo e se erige uma nação. A Paz da partilha.

Nada adianta desejar a Paz de Cristo ao irmão que está com fome se não lhe saciarmos. Paz para quem está preso injustamente não se leva apenas com palavras bonitas, mas com a palavra da justiça, que liberta.

Paz para você e para mim, com os pés no chão, o olhar para o irmão e a prece para o céu.

Paz, a Paz de Cristo para todos.

 

Assuero Gomes

Médico e escritor


 

 

  

 

 

terça-feira, 23 de outubro de 2012

A arte de governar


 
 
 
 
A arte de governar

 

 
A arte de governar consiste em exercer o ofício de jardineiro; este procura harmonizar as diversas formas de vida que brotam da terra, conhecendo profundamente seus segredos e respeitando seus tempos, sabendo que a beleza do jardim consiste na sua diversidade.

O bom jardineiro, embora leve em consideração as cercas, sabe que a primavera não as respeita e que o senhor do jardim faz chover sobre as flores e sobre as ervas daninhas da mesma forma. Embora lhe possa doer o coração, há que podar os ramos no tempo certo, para que a florescência não feneça e desabroche bela em pleno vigor. Há que reparar com carinho o caniço rachado e jamais excluir as plantas mais frágeis, mais desnutridas, sem viço, pelo contrário, estas devem ter sua preferência no cuidar.

Antes de por a mão no solo e nas plantas, o jardineiro tem que estar em paz consigo mesmo. Deve ter amainado suas tempestades interiores, sua aridez de alma e generoso para si próprio, deve fazer brotar com amor, o orvalho da harmonia interna, que rega o corpo e o espírito, e traz a paz na sua forma mais sublime.

O equilíbrio é o princípio e o fim de um bom jardineiro, ou de um bom governante. O equilíbrio se dá quando nossa natureza permite admirar e incorporar o adverso, o diferente, e é nessa completude que o temor, pai de toda violência, é afastado, temor este gerado no desconhecimento do outro.

O jardineiro deve ter a paciência de um monge. Deve saber escutar até o crescer da grama. Deve se orientar pelo canto dos pássaros e pela mudança do sopro do vento. Deve amar a cada flor, sabendo que ela é o resultado do equilíbrio harmonioso da raiz, das folhas e até dos espinhos, uns não existem sem os outros. O bom jardineiro deve aguar o solo com as águas dos próprios olhos quando seus rebentos estão sofrendo injúria ou ameaça, deve ser sensível ao infinito às suas necessidades e magnânimo no perdão. Por certo, agindo assim, verá florir seu jardim que resistirá aos rigores do tempo e florirá a cada primavera. Deve lembrar sempre, que o jardim não é seu, e seu ofício é tanto mais nobre quanto mais consciente for de que o Senhor do jardim é o mesmo Senhor das primaveras, e que ele, o jardineiro, está apenas servindo por instantes na parte de terra e do tempo que lhe foi dada.

Na China feudal, o duque de Shao refletiu sobre a arte de governar e enviou estas sábias e belas palavras ao grande imperador Li-Wang, no ano de 845 antes de Cristo:

“Um imperador sabe governar quando os poetas têm liberdade de fazer versos; os atores, de representar; os historiadores de dizer a verdade; os pobres, de rosnar contra os impostos; os estudantes, de aprender suas lições em voz alta; os obreiros, de louvar a habilidade própria e procurar trabalho; o povo, de falar de tudo; os velhos, de por defeitos em todas as coisas.”

Um governante sabe governar quando faz a justiça brotar em cada esquina, frutificada em pão e ternura, e seus ramos darão sombra e abrigo para todos os cidadãos como os pássaros que, trazendo escondido nas suas asas em repouso, o vôo do futuro, fazem seus ninhos nela.

Um jardineiro ama seu jardim como se dependesse dele a primavera e a cor e o perfume das próximas flores escondidas nos botões, e será tão mais feliz quanto mais viçoso e belo o deixará para seu futuro.

Assuero Gomes

domingo, 21 de outubro de 2012

Igreja, pão e circo...


 
 
 
 
 
Igreja, pão e circo...

 

O pão de Jesus é aquele que dividido se multiplica. É o pão da partilha. O pão dos césares é aquele que é distribuído para alimentar a dependência e a subserviência. É o pão da exploração.

César manda seus escravos distribuir seus pães na multidão que, distraída, assiste aos espetáculos circenses, como num grande ringue.

Jesus distribui, Ele mesmo, seu pão, ao povo, que organizado e livre, participa e constrói condições para que a vida floresça e permaneça.

Os césares precisam de palco, de trono, de incenso, de títulos, de vestes longas, pomposas, tiaras, coroas, cetros, sacerdotes e vestais. Trombetas e alaridos anunciam sua presença e sua magnanimidade na distribuição dos pães no circo.

Jesus partilha seu pão no meio do seu povo, como um deles.

No espetáculo circense há feras digladiando-se com homens, homens virando feras deles mesmos, há delírios da plateia, há sangue escorrendo, há dentes rangendo e dentes gargalhando, há pão desperdiçado, há disputa de público, há torcida e fanatismo. O pão dos césares é o pão do circo.

Na partilha do pão de Jesus há as feras que transformam-se em humanidade. Não há disputa. O espetáculo da Vida acontece na comunidade, na igualdade fraterna das diferenças individuais que se complementam no coletivo. O pão de Jesus é o pão da comunidade.

O pão dos césares é produzido através de impostos, de dízimos, de coletas, de ameaças, de coações, de benesses, pois o espetáculo do circo é caro, muito caro. O pão de César escraviza. A roupa de César e sua tiara cravejada é muito cara, sua coorte é muito cara, seu palácio, seus museus, é tudo muito caro. Sua cidadela fortificada é muito cara. Sua estrutura de poder é muito cara. O pão de César é muito caro.

O pão de Jesus é gratuito, como o pão anunciado de Isaías, como o maná. O pão de Jesus alimenta e dá coragem. A estrutura de Jesus, onde Ele partilha seu pão, é simples: o coração de cada mulher e de cada homem, de cada criança, cada família. Um pão de Graça. A tiara de Jesus custou seu sangue e jamais o sangue do povo. Uma tiara de espinhos. A coorte de Jesus é seus amigos e seguidores e sua cidadela é o universo. Seu poder é o serviço. Seu palácio, seu templo, sua roupa é a rua, o ar livre, a roupa de quem está nu e precisa ser vestido. Seu prato é o prato que espera o pão.

O pão de Jesus liberta.

César se sente bem no circo. Lá ele é o dono, é o senhor do circo. Lá ele doma, oprime e seduz. Lá a plateia aplaude em romaria e ovaciona o senhor do circo e paga caro pelo seu pão corrompido.

Jesus se sente bem na casa do pobre, nas pequenas fraternidades, no coração de quem serve com alegria. Jesus parte seu pão e Ele mesmo lho dá, no silêncio de seu coração, na misericórdia e na compaixão, a quem o deseja receber.

 

Assuero Gomes

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Valsa Verde de Capiba


Valsa Verde




O mestre Capiba compôs essa belíssima melodia dedicada aos médicos pernambucanos....

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

O Médico


 
 
 
 
 
 
 
O Médico

 

O médico há de ser tão hábil com as palavras quanto com o silêncio. Ser prudente como uma mãe que carrega seus filhos no colo ao atravessar uma larga avenida estrangeira. Destreza e perícia devem ser os fios condutores de sua arte e de seu ofício, e lembrar sempre que a palavra corta mais que o bisturi, drena e limpa mais feridas que qualquer ato cirúrgico, e que esta mesma palavra se mal aplicada, pode lesionar ou amputar uma alma para sempre, irremediavelmente.

O médico jamais recebe comissões por seu trabalho, nem mesmo salário, nem abonos ou gratificações, pois sua arte não tem preço. Concede o direito de retribuição a título de honra (honorário), pois é digno e justo. É claro e límpido nas suas ações e condutas, frente à sua família, ao paciente e aos seus familiares, estendendo seu comportamento à toda sociedade. Deve ser suave no trato às pessoas, diligente e equânime. Atencioso e com postura ereta em todo lugar no qual se apresenta, exercendo ou não seu trabalho, pois ele é espelho no qual se reflete a esperança das pessoas, inspiração e aspiração para os jovens, emanando da sua pessoa, conceitos que serão aspergidos por sobre toda classe médica.

Há que ser culto sem ser esnobe, e ter a consciência que, por mais hábil que seja, mais informado, mais competente, será apenas um ser humano ajudando o outro na sua fragilidade. Curar, amenizar o sofrimento, consolar, são atributos de Deus, do qual somos infiéis depositários de uma graça que não merecemos. Um dia o médico, sua esposa ou seu filho estarão recebendo os cuidados de outro médico, isso faz parte da inexorabilidade da vida; por isso, jamais, em momento algum, deve receber alguma compensação por atender outro médico, isso, por si só já é uma honra. Participará com determinação e vontade inquebrantável de todas as lutas justas da sua classe.

Há que ter poesia no seu espírito, pois de que outra maneira suportaria o sofrimento do outro?  Quanto à fé, não se pode compreender um ser humano que vai a um lugar de onde os outros fogem, os umbrais da morte, o vale da dor e das lágrimas, o misterioso limite do suportável, sem ter fé. A fé será seu único alimento em algumas situações e sem ela, certamente o médico perecerá, a não ser que não seja humano, então não seria médico.

Deve levar sempre consigo um lenço limpo, e não idolatrar a tecnologia sedutora, não fumar e se trajar de forma coerente com a pessoa que é. Jamais se embriagar, respeitar as leis de seu coração e o limite de seu corpo. Lembrar que o país no qual nasceu é a extensão de seu corpo, portanto você está inserido carnalmente nele. O médico não é uma pessoa comum. É um formador de opinião e é o ser humano que se lhe é permitido chegar mais perto da alma do outro. O sacerdote, no seu ofício sagrado, chega perto desta íntima e delicada relação com outro, no entanto, dificilmente um fiel se mostrará desnudo a um sacerdote, e muito menos permitirá que este lhe perscrute suas mucosas e suas vísceras.

O médico não decidirá sobre sua conduta, pressionado por quem quer seja, nem por forças ocultas, nem religiosas, nem econômicas, nem políticas. Respirará e transpirará Ética todos os dias de sua vida sobre a Terra, e terá uma atenção especial para com os pobres no seu momento de dor, sempre, pois serão eles que o receberão, quando as glórias humanas tiverem passado e das vaidades restarem apenas umas poucas palavras nalguma lápide esquecida varrida pelo vento do tempo e do esquecimento.

 

Assuero Gomes


Médico e escritor

domingo, 14 de outubro de 2012

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Um dia antológico (O Mensalão)







Um dia antológico (O Mensalão)

O Brasil viveu um dia, ontem, 10 de outubro de 2012, um dia antológico. Um dia desses que se deve marcar no coração. Um dia pétreo, como uma pedra angular. Um dia da JUSTIÇA. Um dia que que pode nortear gerações e colocar um cápítulo bom na história da construção da nação brasileira. Construção difícil e sofrida.
O julgamento de pessoas poderosas, politicamente falando, dentro do respeito a todo processo do direito e da justiça, sem revanchismo ou politicagem, sem conflito ideológico ou  de classes, um processo cujo relator não tem nada a ver com as elites do país, pois é negro, nasceu pobre, é esforçado, honesto e culto, à própricusta do esforço próprio e de sua família. Um julgamento cujo juízes não foram unânimes nas suas poderações e seus vereditos, o que afasta quaisquer suspeitas de concluio.
Esse é um dia que o Senhor fez para o Brasil, um dia onde a Justiça se fez brilhar e iluminar o caminho de um povo em busca de sua história e de seu futuro.

Assuero  Gomes
assuerogomes@terra.com.br

terça-feira, 9 de outubro de 2012

O Vivo entre os mortos... (Lc 24,5)


 
 
 
 
 
 
O Vivo entre os mortos... (Lc 24,5)

 

Ante as mulheres sofridas e atemorizadas que foram procurar Jesus no túmulo, o anjo pergunta ‘por que procurais o vivente entre os mortos?’.

As mulheres que procuram os seus filhos nas cadeias, nos noticiários policiais, nas estatísticas dos Institutos de Medicina Legal, são as mesmas que vivem entre túmulos, desviando o coração de balas perdidas e de acidentes de motocicletas. São as mesmas que inalam o crack dos filhos viciados e pagam aos traficantes com seu desespero.

Procuramos nós também Jesus no túmulo onde o puseram (ou pusemos) para que não nos incomodasse e sempre voltamos à lápide tumular para nos certificar que está bem fechada a entrada (ou seria a saída?).

Na quaresma eterna da caminhada das mulheres, vemos e convivemos com milhares de mortos e muitas vezes não pensamos encontrar Jesus entre eles. São os mortos pelo descaso da saúde pública, os que continuam comendo lixo no país da fartura, os sedentos no país dos mananciais, os mortos do sistema da justiça, dos que já nascem mortos socialmente. Buscamos Jesus nos grandes túmulos suntuosos que chamamos catedrais, para que seu corpo inanimado, inerte, repouse o sono dos séculos e não nos assombre a consciência de vez em quando, permanecendo ali, bem quietinho, no sacrário de ouro.

Como é tranquila a paz dos cemitérios!

Como perturbam essas mulheres que vêm procurar o Nazareno! Deixem que durma em paz, como numa derradeira manjedoura, pois o natal já passou.

No grande cemitério nacional assombrações de paletó e gravata infernizam a vida do povo. Desviam, subtraem, malversam, subjugam, exploram, enriquecem, enriquecem, enriquecem, com o dinheiro amaldiçoado trinta vezes, pois são o preço da escravidão de uma nação inteira. Quem era para mudar mantém, quem era para redimir, corrompe, que era para libertar, aprisiona, são os mortos vivos, vagando cegos pelo dinheiro e pelo poder de César.

Mas, por que procurais o Vivo dentre os mortos?

Ele tomou as vestes alvejadas no sangue do testemunho, calçou as sandálias da liberdade, inaugurou o Dia do Senhor como numa Páscoa eterna e plena, e agora anda livre nas estradas, soerguendo os irmãos e irmãs debilitados nas esquinas, alimentando com o pão da partilha, criando pequenas comunidades fraternas nas vielas e desvios dos grandes centros.

Mas, por que procurais o Vivo dentre os mortos?

Deixai que os mortos enterrem seus mortos, pois o Vivente está ressuscitando pessoas e nações, está curando, está salvando o Homem do próprio homem, reintroduzindo a humanidade perdida no coração de cada um e pondo uma brasa ardente na língua dos pequeninos e uma flecha em seus corações, para que a Palavra seja anunciada e transforme a realidade do cortejo, fúnebre no qual estavam mergulhados, numa grande procissão festiva das bodas definitiva do povo com seu Deus.

Mas, por que ainda procurais o Vivo dentre os mortos?

Ide agora e escutai essa boa nova, primeiro dentro de vós mesmo e depois a anunciai aos doze de vossa comunidade e a Terra inteira. Hoje é Páscoa, a Páscoa definitiva, a vitória da Vida sobre toda morte.

 

Assuero Gomes

domingo, 7 de outubro de 2012

Justiça


 
                                             Berlin Zoo

 

JUSTIÇA


 

No mundo em que vivemos, os ricos e poderosos muitas vezes oprimem os pobres, para usufruírem do seu trabalho, ou desviar seus recursos, ou ainda para juntar riquezas de maneira desonesta.

A ganância gera injustiça e a injustiça gera violência.

Deus é um justo juiz. Em toda Bíblia Ele aparece enviando profetas para mostrar aos poderosos sua vontade e como deve se organizar a vida do povo, para que a nação progrida em paz e haja fartura para todos. Por fim Deus enviou seu próprio filho, Jesus, que muitas vezes falou sobre juízes injustos e mostrou que a prece das viúvas e dos órfãos (pobres) chega até Ele.

A justiça para todos, igualitária, sem concessões, aplicada de maneira constante sobre toda a organização social de um povo, faz brotar Vida e Paz.

A justiça é um dom de Deus e um direito de todos.

A justiça é como a chuva que molha a terra e não conhece cercas, que cai sobre o rico e o pobre, sobre a criança e o ancião, sobre o homem e a mulher. A justiça é, ainda, como o vento que sopra, trazendo alívio e refrigério, alisando a relva e empurrando nuvens para além de obstáculos. Ainda, a justiça é como o fogo, que aparta e purifica o trigo do joio, e coze o alimento, e doura o pão da igualdade.

A justiça deve começar dentro da nossa cabeça e do nosso coração e se espraiar pelo esposo e esposa e filhos, e ensinada em cada casa e em cada escola, e praticada em cada comunidade, para que brilhe como a aurora e ilumine o país e a Terra toda.

 

 Assuero Gomes

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Francisco






                             Francisco


Esse é o mês de Francisco.

Quem como Francisco de Assis?

Acendeu uma luz no porão da Igreja.

Tocou fogo no coração dos jovens.

Ardeu no Amor Seráfico, amou como ninguém o próprio AMOR.

Nele a humanidade se reencontrou com a humanidade de Jesus, nele Jesus mostrou que suas chagas são cicatrizáveis.

Francisco o pobrezinho de Assis, o pobrezinho de Roma, Urbi et Orbi.

Um sacramento de Jesus para sua Igreja, para o mundo.

Assuero.

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

O Perdão







 

O  PERDÃO
 

O perdão é o filho pródigo da misericórdia. Ele nasce da solidariedade e da compaixão. A vida dos seres humanos muitas vezes é muito difícil de ser vivida: doenças, miséria, fome, sede, desrespeito, abandono, sendo quase impossível em algumas situações seguirmos fielmente os ensinamentos de Cristo.

Muitas pessoas, grupos e até instituições religiosas, criticam e expulsam pessoas de seu convívio, por elas terem cometidos faltas, muitas vezes motivadas pelo desespero ou pela falta de uma orientação segura, de um acolhimento ou de alguém que as escute.

A prática do perdão é uma prática divina. O que mais Jesus fez foi perdoar, até na hora sofrida da sua morte. Muitas vezes ao curar os doentes Ele dizia, vá e tuas faltas estão perdoadas. O perdão está ligado à cura e à salvação.

Penso que se Deus não perdoasse todos os dias e à toda hora a humanidade toda e a cada um em particular, não haveria mais vida humana sobre a Terra.

Por isso Jesus assume sobre si as faltas, as dores, os sofrimentos, dos homens e das mulheres, para que a Vida permaneça.

Jesus é o próprio Perdão.

Quem somos nós ou nossa comunidade para deixar de perdoar alguém? Se Jesus é o próprio Perdão...