O Vivo entre os mortos... (Lc 24,5)
Ante as mulheres sofridas e atemorizadas que foram procurar
Jesus no túmulo, o anjo pergunta ‘por que procurais o vivente entre os
mortos?’.
As mulheres que procuram os seus filhos nas cadeias, nos
noticiários policiais, nas estatísticas dos Institutos de Medicina Legal, são
as mesmas que vivem entre túmulos, desviando o coração de balas perdidas e de
acidentes de motocicletas. São as mesmas que inalam o crack dos filhos viciados
e pagam aos traficantes com seu desespero.
Procuramos nós também Jesus no túmulo onde o puseram (ou
pusemos) para que não nos incomodasse e sempre voltamos à lápide tumular para
nos certificar que está bem fechada a entrada (ou seria a saída?).
Na quaresma eterna da caminhada das mulheres, vemos e
convivemos com milhares de mortos e muitas vezes não pensamos encontrar Jesus
entre eles. São os mortos pelo descaso da saúde pública, os que continuam
comendo lixo no país da fartura, os sedentos no país dos mananciais, os mortos
do sistema da justiça, dos que já nascem mortos socialmente. Buscamos Jesus nos
grandes túmulos suntuosos que chamamos catedrais, para que seu corpo inanimado,
inerte, repouse o sono dos séculos e não nos assombre a consciência de vez em
quando, permanecendo ali, bem quietinho, no sacrário de ouro.
Como é tranquila a paz dos cemitérios!
Como perturbam essas mulheres que vêm procurar o Nazareno! Deixem
que durma em paz, como numa derradeira manjedoura, pois o natal já passou.
No grande cemitério nacional assombrações de paletó e
gravata infernizam a vida do povo. Desviam, subtraem, malversam, subjugam,
exploram, enriquecem, enriquecem, enriquecem, com o dinheiro amaldiçoado trinta
vezes, pois são o preço da escravidão de uma nação inteira. Quem era para mudar
mantém, quem era para redimir, corrompe, que era para libertar, aprisiona, são
os mortos vivos, vagando cegos pelo dinheiro e pelo poder de César.
Mas, por que procurais o Vivo dentre os mortos?
Ele tomou as vestes alvejadas no sangue do testemunho,
calçou as sandálias da liberdade, inaugurou o Dia do Senhor como numa Páscoa
eterna e plena, e agora anda livre nas estradas, soerguendo os irmãos e irmãs
debilitados nas esquinas, alimentando com o pão da partilha, criando pequenas
comunidades fraternas nas vielas e desvios dos grandes centros.
Mas, por que procurais o Vivo dentre os mortos?
Deixai que os mortos enterrem seus mortos, pois o Vivente
está ressuscitando pessoas e nações, está curando, está salvando o Homem do
próprio homem, reintroduzindo a humanidade perdida no coração de cada um e
pondo uma brasa ardente na língua dos pequeninos e uma flecha em seus corações,
para que a Palavra seja anunciada e transforme a realidade do cortejo, fúnebre
no qual estavam mergulhados, numa grande procissão festiva das bodas definitiva
do povo com seu Deus.
Mas, por que ainda procurais o Vivo dentre os mortos?
Ide agora e escutai essa boa nova, primeiro dentro de vós
mesmo e depois a anunciai aos doze de vossa comunidade e a Terra inteira. Hoje
é Páscoa, a Páscoa definitiva, a vitória da Vida sobre toda morte.
Assuero Gomes
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