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segunda-feira, 29 de outubro de 2012

O Resto de Israel


 
 
 
 
 
O Resto de Israel            

 

 

Para ser o resto de Israel é necessário descer as montanhas, é necessário segurar a manhã com a mão e molhar o chão com o suor do próprio corpo. Para ser o resto de Israel é preciso não temer, não ter mais nada a perder, cultivar solitário a última figueira e dela esperar um único fruto.

Para ser o resto de Israel não basta simplesmente ser católico, há que ser cristão e se reconstruir o templo do coração, em carne e misericórdia. Para ser o resto de Israel, chorar é preciso e navegar nas lágrimas da última quimera desfeita, é ter certeza que a mão que afaga jamais apedrejará. É atender o pobre, é cuidar do ferido, é servir a mesa do indigente, da viúva e do órfão, e sempre que tiver feito tudo ao seu alcance, sentir-se como um servo inútil.

O resto de Israel é como a última semente, na terra ressequida, esperando uma gota de chuva. É como a arca do ancião que navegou em águas tenebrosas e viu a criação ser quase toda destruída e mesmo assim jamais perder a esperança, pois ela mesma é a esperança. Ser o resto de Israel é brigar com Deus para subir a escada que dá no paraíso e não conseguindo vencer a Deus, sair ferido na coxa para sempre, e mesmo assim não desistir.

O resto de Israel trás dentro de si a certeza de Abraão e a liturgia de Melquisedec. Carrega consigo a ternura de Maria e o medo dos discípulos. Tudo espera, tudo crê, tudo conforta. É amável, humilde e puro. É terra e é água. Não se assombra com dificuldades, não teme o futuro, não se desola mais. É a última semente da Terra. Nela Deus vai colocar seu sopro.

Para ser o resto de Israel é preciso amar...

Amar sem medidas e sem pudores, sem limites. É suportar amar sem ser amado e mesmo assim sempre procurar o melhor para sua amada, a pequena nação, às vezes de uma só pessoa.

Para ser o resto de Israel é necessário sobreviver. Com cruz, com espada, com o ferro do suplício, com os espinhos e com a brasa. Um só caminho, uma só direção e o infinito como terra prometida e sempre que olhar, vendo o deserto, acreditar que logo mais, após a primeira duna, surgirá o leite e o mel derramado de montanhas e vales verdes.

Para ser o resto de Israel é, mesmo cego, caminhar procurando a luz e saber que mesmo sem a ver, ela lhe encontrará com a certeza de um predestinado, pois no resto de Israel é onde Deus colocou seu coração. É tateando tocar na chaga da necessidade do pobre e ali ver que está tocando na chaga do próprio Cristo, porém não adorá-la, mas apressar-se em cuidá-la.

É ter a certeza num mar de incertezas que valeu a pena, pois o coração de Deus, está no resto de Israel.

 

Assuero Gomes

Médico e escritor


 

 

 

 

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