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sábado, 14 de julho de 2012

Sobre a Felicidade



Sobre a Felicidade, ou simplesmente felicidade.



Tentar conceituar um sentimento é como pôr uma âncora num beija-flor e esperar que ele continue flutuando no ar. Muitas definições de “felicidade” já foram tentadas, escritas ou faladas, refletidas, ensinadas.

Para algumas religiões, a felicidade seria a ausência absoluta de desejo. Somente quando houvéssemos abstraído todo desejo e percebido a realidade na qual estamos inseridos como algo irreal ou transitório, assim estaríamos em felicidade plena. Superar as necessidades também seria um caminho, mortificando o corpo para libertar a alma. Só a alma, como algo perfeito, poderia realmente habitar o reino da felicidade.

Há correntes de pensamento que acreditam que nossa pulsão ao desejo, em todos os níveis, é uma busca constante da felicidade, que só é alcançada momentaneamente enquanto aquele objeto de desejo é possuído, mas logo em seguida, outro impulso é gerado e nossa busca segue indefinidamente, talvez numa tentativa de retorno ao estado fetal, onde inconscientemente nos acharíamos em perfeita harmonia conosco e com o ambiente: a saudade do útero materno.

Para alguns místicos a nossa inquietude e essa eterna busca pela felicidade seria um movimento de retorno ao coração de Deus, de onde teríamos saído.

Na verdade vi algumas pessoas felizes por alguns momentos de suas vidas. Breves momentos. É frustrante até certo ponto, pois idealizamos uma felicidade que fosse quase eterna enquanto durasse nossa permanência aqui na Terra. É monumental o esforço sobre-humano que fazemos para nos sentirmos felizes, às vezes um objetivo perseguido durante toda a existência e só alcançado por uns poucos, por algumas horas, talvez minutos.

Vi muitas pessoas ficarem felizes com um prato de comida e um pedaço de doce, ou um copo d’água, ou uma camisa velha, ou com um afago, um sorriso ou um aperto de mão, que lhe devolveu a humanidade por alguns instantes. Vi pessoas abnegadas, dedicadas ao extremo, na ajuda aos outros, e pareciam menos tristes, mais aliviadas em suas existências. Raramente, mas vi alguém esboçar uma face de felicidade no instante da própria morte, aliviada do sofrimento da enfermidade.

Nunca, no entanto, vi alguém totalmente feliz o tempo todo, mesmo que esse tempo todo fosse pouco mais de doze horas, que é a metade de um dia. Temo por pessoas de riso fácil, muito expansivas e pouco reflexivas, efusivas, todo tempo, por detrás ou dentro de si trazem oculta, talvez, uma grande melancolia.

Talvez a procura da felicidade total e perene seja um grande fardo, pesado demais para os humanos, que trazem consigo as máscaras gregas da comédia e da tragédia; como o palco é estreito, as luzes são fracas, a peça tem poucos atos, o espetáculo é curto e a plateia raramente aplaude, talvez e talvez, devêssemos nos contentar com os nossos efêmeros e radiantes momentos de felicidade, antes que as cortinas se fechem.



Assuero Gomes

Médico e escritor



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